Nacional
Crónica de Carlos Leitão

Alfredo, nome de Portugal

Qui, 21/01/2021 - 19:30

Conheça a história de Alfredo. Um angolano que veio para Portugal receber tratamento médico.

Era uma vez Alfredo, angolano que há três anos chegou a Portugal para receber tratamento médico. Que-

dou-se por Azeitão para conseguir legalidade, trabalho e meia dúzia de tarecos que não fazem a alegria de um europeu pobre. Tem a bondade num rosto belo e o sorriso perfeito ao qual, a priori, nenhum dentista deitará a unha. Não se lhe adivinham rugas, traz a gratidão de quem precisa de todos e projeta nos músculos os sonhos das filhas. Médicas é o que elas querem ser. O terceiro filho, esse, ainda não o conhece.

Alfredo quer a naturalidade da família junto a si. Com ajuda, tem-se conseguido escrever a história, pelo menos até chegarmos à Loja do Cidadão. Por Setúbal, marca-se uma espécie de audiência no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – pasme-se! – em Aveiro. Com ganas e esperanças várias, a viagem faz-se, mas a obliquidade de uma senhora a quem falta colo ditou as regras. A marcação era, afinal, para “alteração do email” e, face a isso, não há Simplex que sobreviva à canalhice aleatória de quem não faz o SEF, mas também o compõe. Chutou para longe, que esse não é problema dela. Se for para mudar o email, seja muito bem-vindo!

Desta vez, não faltaram papéis. Há uma senhora mal-amada e a incompetência de quem o mandou fazer 300 km para chegar aos braços dela. E nenhuma pensou, por segundos, no Alfredo que tem saudades da família…

É homem crente e, na resignação do regresso a casa, a visita a Fátima encheu-lhe as mãos vazias. Um sonho concretizado já não é mau para quem pede tão pouco e agradece tanto. Trouxe consigo o alento cristão para o que há-de vir, personificando a inocência de quem ainda acredita numa humanidade que não se cumpre.

“Um tapete para pôr os pés quando me levanto” foi a resposta à disponibilidade de quem o quer ajudar. Alfredo não quer televisão nem aquecedor, para não gastar luz, recebe cabazes alimentares da paróquia, trabalha nas obras e o pouco que consegue amealhar é para a família. A única coisa que quer é a mulher e os filhos junto dele. Tal como nós, os bem-afortunados que ainda ousam queixar-se.

Tudo isto podia ser apenas uma história romanceada, não fosse a triste rotina de um Mundo estranho e de um homem bom que não pára de sorrir.

Texto: Carlos Leitão, fadista

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